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A humilhação pública das Forças Armadas

24/05/2021

Lier Pires Ferreira

PhD em Direito. Professor do Ibmec e do CP2. Pesquisador do Lepdesp/Uerj

Em 1922, Benito Mussolini tornou-se primeiro-ministro da Itália. Em pouco tempo, fulminou a então jovem democracia do país, implantando um regime totalitário, fascista, que subordinava todas as esferas da vida social aos anseios do Duce. A frente de um governo ultranacionalista, populista, antiliberal e anticomunista, suportado por ferozes milícias paramilitares, o autoproclamado Primeiro Marechal do Império também sujeitou as forças armadas aos seus interesses pessoais, com destaque para o Exército italiano, ao qual servira na I Guerra Mundial.

Ao longo das últimas décadas o fascismo teve diferentes expressões e desdobramentos. Para Umberto Eco, dentre os sintomas do fascismo eterno estão o culto à tradição e ao nacionalismo, a rejeição ao pensamento crítico, o machismo heroico e o discurso populista, fortemente voltado aos socialmente enjeitados, frustrados, que, como massa de manobra, são envoltos por uma midiasfera própria, pela qual o “líder” se comunica diretamente com as bases populares.

Assim como a Itália nos anos 1920, o Brasil em 2018 elegeu um líder populista, descompromissado com a democracia e a preservação da vida. O negacionismo criminoso de Bolsonaro em face da pandemia da Covid-19, que já contabiliza mais de 450 mil mortos, ratifica essa percepção, ao mesmo tempo em que choca o mundo e impõe dor e sofrimento a milhares famílias. Mas diferente de Mussolini, que, filho de um ferreiro anarquista, na juventude militara no Partido Socialista, Bolsonaro jamais escondeu sua face. O Brasil já conhecia sua homofobia e seu machismo tóxico, seu heroísmo militarista e seu descompromisso com a ordem democrática, mimetizada em sucessivas loas ao golpe de 1964 e à tortura. Conquanto tenha sido expulso com desonra do Exército de Caxias, Bolsonaro sempre contou com o apoio sistemático das forças armadas, que viram nele a chance de uma volta por cima na política pátria, após terem sido alijadas do núcleo do poder nacional com a redemocratização.

O ex-capitão, no entanto, jamais se esqueceu de quando foi achincalhado pelo alto oficialato do Exército, sendo caracterizado pelo então general-presidente Ernesto Geisel como um “mau militar”. Rancoroso e recalcado, Bolsonaro e seu clã olavista fixaram relações orgânicas com praças, baixo oficialato, polícias e mesmo com milícias solidamente assentadas em diferentes estados brasileiros, em particular o Rio de Janeiro, que o adotou. Por esse motivo, diferentes oficiais-generais são reiteradamente humilhados pelo presidente, que hoje é o comandante em chefe das forças que o rejeitaram. A lista dos humilhados é longa, sendo composta por nomes como Santos Cruz, Azevedo e Silva, Rego Barros e Edson Pujol.

Os “humilhados do baile” bolsonarista em geral se recolhem às sombras, talvez por vergonha dos serviços prestados. Mas há muitos outros, que, aliciados, “lideram” os mais de seis mil militares empregados em diversos escalões do governo. Dentre estes, nomes de peso como Augusto Heleno, Luiz Eduardo Ramos e Braga Netto, além do vice-presidente Hamilton Mourão. Embora possam estar de pijamas, aos olhos da sociedade, como em seus corações, eles representam as forças armadas.

Mas o caso mais escandaloso é o do general Eduardo Pazuello, ainda na ativa. Nomeado ministro da saúde em 2020 após longo período de interinidade, Pazuello traz na face o emblema do Exército. Hoje, contudo, é motivo de constrangimento para sua arma. Após ter sido demitido em função da desastrosa gestão da pandemia do coronavírus, Pazuello está sendo acossado pela CPI da Covid. Mesmo assim, seduzido pelo poder presidencial, compromete seu futuro e, quiçá, sua liberdade, agindo como títere do presidente. Seu último grande equívoco ocorreu no domingo, 23/05. Sem máscara, sorridente, Pazuello agiu como um “mau militar” e, desonrando o Estatuto das Forças Armadas, sujeitou-se a participar do ato político-eleitoral em apoio a Bolsonaro, aglomerado com milhares de apoiadores na orla carioca em plena crise sanitária.

A tolice de Pazuello, agora, custa caro ao Exército, que se vê compelido a adotar um procedimento administrativo contra seu general-político. Mas é certo que tal procedimento não irá punir Pazuello com o rigor que faria com uma praça ou um oficial de baixa patente. Em outras palavras, diferente de Bolsonaro, o irresponsável Pazuello não será expulso do Exército. Uma saída “honrosa” será passar o obeso general para a reserva remunerada, possivelmente com data retroativa à 23/05, de modo que, oficialmente, sua participação no ato de apoio ao presidente seria formalmente desvinculada de sua condição de militar da ativa.

De toda sorte, o estrago está feito. Se não punir exemplarmente seu general, o Exército evidenciará que seus regulamentos não valem igualmente para todos, enfraquecendo o espírito de corpo e solapando o binômio hierarquia e disciplina que, idealmente, sustenta a vida militar. Se o punir, corre o risco de ser desautorizado por Bolsonaro, que, como presidente, pode anular a decisão do comando, humilhando publicamente as forças armadas e atiçando militares a se politizarem cada vez mais, como ocorre com o próprio Pazuello. O Exército e as forças armadas estão sendo placidamente tragados pelo fosso bolsonarista. Seduzidos pelos louros do poder, empenham sua dignidade em favor de um governo fadado porões da história. Politizados por suas relações orgânicas com o presidente, capitulam ao fasciobolsonarismo, traindo seus ideais e desgastando o prestígio tão duramente construído após a redemocratização. Oxalá que o Brasil de 2021 não seja a Itália de 1922. Que as vozes dissonantes nas forças armadas se façam ouvir, não permitindo que o Brasil se afaste da democracia e do respeito à Constituição Federal. O alerta está ligado. O país corre contra o tempo.

 




 







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