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No olho da tormenta: Lula e a política israelense na Palestina

20/02/2024
Lier Pires Ferreira
PhD em Direito. Pesquisador do LEPDESP/UERJ e do NuBRICS/Uff

Considerado um dos mais importantes líderes britânicos, Churchill interpretava a realidade pragmaticamente à luz das relações de poder. Foi com este espírito que proferiu uma de suas frases mais célebres: A política é quase tão excitante quanto a guerra e não menos perigosa. Todavia, na guerra a pessoa só pode ser morta uma vez, mas na política diversas vezes.
Lula é um sobrevivente político. Retirante nordestino, construiu uma carreira sui generis, na qual, às suas conquistas como líder sindical, deputado constituinte e único brasileiro três vezes eleito para a presidência da República, contrapõem-se derrotas eleitorais, denúncias de corrupção e uma controvertida prisão no âmbito da Lava-Jato. Agora, quando seu terceiro mandato enfrenta forte oposição no Congresso Nacional, Lula põe de novo sua “vida” em risco. 

Há alguns dias, na Etiópia, o presidente brasileiro comparou as ações israelenses em Gaza ao Holocausto. Em resposta, Netanyahu declarou o presidente brasileiro como persona non grata, classificando suas declarações como “vergonhosas”. Não satisfeito, Netanyahu subiu o tom, acusando o brasileiro de antissemitismo. Na sequência, seu chanceler, Israel Katz, classificou a comparação feita por Lula como “promíscua e delirante”, exigindo um pedido oficial de desculpas. 

A briga está feia e não é a primeira vez que Lula e Netanyahu batem de frente. Em 2010, em uma visita oficial a Israel, o petista se recusou a visitar o túmulo de Theodor Herzl, o controvertido “pai” do sionismo, embora tenha visitado o museu do Holocausto e depositado flores no túmulo de Yitzhak Rabin, o ex-primeiro-ministro que iniciou os diálogos de paz com os palestinos e foi assassinado pela extrema-direita israelense. Mas agora a relação azedou de vez. 

A declaração de Lula é polêmica, mas não o suficiente para esta escalada. Afinal, Lula não atacou o povo judeu, não fomentou o preconceito contra os israelitas ou suscitou qualquer medida contrária à sua existência, integridade ou história. Além disso, o Brasil sempre teve boas relações com o Israel, tendo concorrido para sua criação nos anos 1940 e abrigando milhares de judeus em seu território, brasileiros ou não. Neste contexto, parece claro que, frágil politicamente, e ciente da crescente reação mundial ao chacinamento de civis na Palestina, Netanyahu aproveitou a declaração do presidente brasileiro para unir os judeus em torno da memória do Holocausto, buscando legitimar suas ações contra a população palestina. Esse é o ponto central.

É inequívoco que Israel tem o direito de existir, da mesma forma que tem o direito de reagir às agressões contra o seu território. Entretanto, não há direitos absolutos, de modo que uma reação legítima não pode ser desproporcional à agressão sofrida. Netanyahu tem agido como um sociopata, usando a força para dominar novos territórios e esconder os erros de segurança que permitiram o ataque do Hamas à população israelense. Cruel, tem promovido um morticínio contra civis na Faixa de Gaza, como reconhecido pelo próprio Vaticano. Nada justifica as quase 30 mil mortes operadas pelas forças israelenses, que, apesar da brutalidade, ainda não conseguiram libertar os reféns ou liquidar o Hamas. 

Além disso, a causa palestina tem conquistado crescente reconhecimento internacional. Gol do Hamas? Pois bem, se em 2012 a ONU já havia aceitado a Palestina como Estado observador, hoje os próprios Estados Unidos falam abertamente na criação de um Estado palestino, na linha do que vem afirmando o presidente Lula. Neste contexto, Netanyahu se agarra à controvérsia com o Brasil como tábua de salvação contra os insucessos da sua contraofensiva e do seu crescente isolamento internacional. É nítido que a conta da selvageria não vai demorar a chegar ao seu gabinete.

O conflito entre o Hamas e Israel tem capturado corações e mentes ao redor do mundo, não sendo diferente no Brasil, onde é retroalimentado pela polarização direta versus esquerda. Ao equiparar os judeus aos seus algozes, Lula se colocou no olho da tormenta e ultrapassou os limites do pragmatismo em favor de uma postura militante. Deliberadamente ou não, o presidente brasileiro dinamitou pontes e atraiu críticas talvez desnecessárias, projetando o Brasil no epicentro da guerra em Gaza. Lula terá que administrar tal desgaste. Todavia, sua declaração expôs os excessos das ações bélicas na Palestina no momento em que boa parte da população está confinada na fronteira com o Egito, vivendo à iminência de um massacre em Rafah. Terá salvo vidas? Talvez.

Mas que não se perca o mérito de suas palavras. O extremismo sionista – hoje personificado por Netanyahu -, vem sendo criticado por diferentes gerações de judeus, como revela a famosa carta de Albert Einstein ao New York Times, que, em 1948, denunciou a presença de grupos fascistas, chauvinistas e terroristas na política israelense. Do mesmo modo, se a recente decisão da Corte Internacional de Justiça (CIJ) determinou que Israel adote medidas que evitem o genocídio palestino, reconhecendo implicitamente a existência de crimes contra civis em Gaza, é importante lembrar que, no contexto da pluralidade sociopolítica do povo judeu, há crescentes oposições à Netanyahu, dentro e fora de Israel, todos inconformados com aquilo que, há poucos dias, Edgar Morin chamou de “carnificina massiva” contra civis palestinos. 

Portanto, apesar do estardalhaço que vem fazendo, Netanyahu não expressa a pluralidade do povo judeu, assim como antissionismo não é antissemitismo. Está na hora da sociedade internacional, por meio da ONU e outros polos de poder, estancar a matança em Gaza, libertar os reféns israelenses e fixar uma força de paz para estabilizar a região. Também é imperativo obter o amplo reconhecimento do Estado de Israel, reverter o colonialismo sobre os territórios árabes ocupados e criar o Estado Palestino. Situações de emergência exigem medidas urgentes. Não haverá paz no Oriente Médio sem um Estado Palestino, pois, salvo na política, a vida é uma só.

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